sexta-feira, 27 de setembro de 2024
quinta-feira, 26 de setembro de 2024
O andarilho e a casa
quarta-feira, 25 de setembro de 2024
terça-feira, 24 de setembro de 2024
Transentir
afundados no que eu sinto
ou quando longe, ilhados
pairam na paisagem da memória.
domingo, 15 de setembro de 2024
Acho importante estar em sintonia.
Hoje, por exemplo, um dia
cinzento e solitário. Meu almoço combinava bem o amargo das fibras com o
tempero azedo e a ausência de gordura. Nem parece que botei sal. Ainda bem.
Parecia catado do chão (da floresta, não da cidade, o que não é tão ruim). E o
vinho, então, harmonizou perfeitamente. Era velho.
Mark Knopfler acompanhou com sua nova canção estilo velho Cash, enquanto Brendan Perry memorava coisas tais como: filhos do sol, do mar viemos, sacrifícios para elementais e, na cabeça, girassóis.
Na remada da manhã, constância e consistência até alcançar um não lugar, mas o cansaço, e sustentá-lo. Chegando no meio do nada, deve-se voltar.
Me senti bem depois da remada, da
música e da comida amargas. Mas aqui dentro ainda tento acertar o ritmo e a
vida não é carreira solo.
Experimento o que me ensinam Buda
e Ricardo Reis. Mora ali a resposta? Ou seria o blues? Não sei. Tenho percorrido
um mar de morros. Agora nesse vale fundo morreremos sós, céu, monotônicos?
Encarei a parede e adormeci.
(Em segredo, um pássaro cantou)
...
Em segredo, adorava uma divindade. Expressava diária e monologamente o desejo de ter com ela para longas conversas, ouvir sua sabedoria e receber diretamente amor. Naquele dia, finalmente, lhe apareceu. Vestia a noite e uma estrela, daquelas que só aparecem na visão periférica, então não lhe podia olhar diretamente. Sobre as elevadas expectativas, no entanto, derramou-se um balde d’água fria de secura ardente: “VEJA! NÃO SOU. LIBERTE-SE!”. Desapareceu.
Arrasado, saiu para lugar nenhum pisando sobre nada e tropeçando em verdades, levando-o inevitavelmente a cair no vazio. Tentava agarrar-se em algo, em vão.
Entediado pela queda interminável, tirou do bolso um velho guia físico-espiritual constituído de uma página onde estava apenas representado um barbante na vertical e, de cada ponta, abriam-se universos (d)e conceitos. Pela primeira vez, então, experimentou virar a página sem sair da folha, já que era a única. O resultado da mudança de ângulo para a nova dimensão foi ver que o barbante era, em realidade, uma circunferência em que as duas cosmopontas se ligavam, de modo que uma aparente oscilação para cima e para baixo consistia em ilusão gerada a partir de um movimento circular contínuo.
Passou a viver sob essa “cosmocircunvisão
em queda livre” e compreendeu como era possível ser feliz e triste ao mesmo
tempo. Que a beleza não era uma qualidade das coisas, mas um impulso para a
transmutação dos sentimentos. Aprendeu a amar sem receber e a reconhecer o que
não poderia ser tanto se não fosse apenas.
Muito espaço-tempo depois, a
queda se consolidou: não era chão, mas mar . Tão longe-longa a queda que
esqueceu da divindade. Boiando, percebeu e disse: “Ha! Libertei-me de ti!”. Quando,
então, de um velho canoeiro, chamado “Seu Divino”, ouviu: “SE VOCÊ PENSA QUE
FOI DE MIM QUE SE LIBERTOU, NÃO ENTENDEU NADA”. Suplicou: “Dê-me outra chance. Como
posso compreender tudo e libertar-me verdadeiramente?”. “VARRA A CALÇADA”.
“Hum... ok. E depois que terminar?” “DEVE DEIXAR QUE SUJE NOVAMENTE E, ENTÃO, VARRÊ-LA”.
“Tá, mas... e no intervalo?” “RESTAURAR CAPAS DE DISCOS DE VINIL”.
Já entendendo aonde aquilo iria não chegar, despediu-se e partiu. Dessa vez não em meio ao nada, mas a nado. Parou e, uma última vez, voltou o olhar. Longe e velho se reconheceu, remando. Saltou um peixe.